Seduzido pela história, quase cai em uma armadilha emocional.
Como fui surpreendido pela técnica de persuasão e o que você pode aprender para não cair na mesma armadilha
Na minha primeira negociação realmente complexa, enfrentei um grande desafio: contratar uma atriz famosa para protagonizar uma novela no horário nobre. Ela não trabalhava com agentes ou representantes, pois preferia negociar pessoalmente.
Ela sabia que o personagem havia sido escrito pensando nela. Além disso, era uma artista com star quality — sua presença no projeto era estratégica, e a área comercial apostava fortemente na sua participação, já que o mercado publicitário estava repleto de planos vinculados ao seu nome.
O problema era o orçamento: em função da queda na rentabilidade dos nossos produtos, os valores estavam bastante reduzidos. O valor disponível para sua contratação era inferior ao de seu último contrato.
Agendei o primeiro encontro com bastante nervosismo. Aquela contratação era fundamental para a empresa — e para mim, como forma de provar meu valor profissional. Preparei-me com profundidade: estudei a proposta e, principalmente, mergulhei na trajetória da atriz — novelas, filmes, entrevistas. Acredito que repertório é essencial para gerar conexão.
Durante horas conversamos sobre suas motivações e o que ela buscava naquele trabalho. À medida que a conversa evoluía, ela começou a compartilhar aspectos pessoais: um momento delicado de vida, dificuldades emocionais após uma separação e até problemas financeiros.
Quando chegou o momento de apresentar a proposta financeira, percebi que não havia clima. Ela estava visivelmente emocionada, com lágrimas nos olhos, dizendo que precisava de uma proposta generosa para ajudá-la a se reerguer.
Decidimos suspender a conversa e remarcar um novo encontro. Saí profundamente impactado emocionalmente.
Durante o período de espera, conversei com pessoas próximas a atriz— e infelizmente, descobri que a história não era verdadeira. Ela não enfrentava dificuldades financeiras. O que presenciei foi, na verdade, o uso habilidoso de uma técnica de persuasão.
Semanas após o último encontro, retornamos às nossas conversas. Apresentei a proposta original, com a redução de custos definida desde o começo e mantive o tom respeitoso, mas fechei o coração para as reações emocionais dela. Foi uma conversa muito difícil, pois cada palavra dela sobre angústia e necessidade, soou-me agora como parte de um jogo de influência — e eu me recusei a ser peça desse jogo.
Por fim, impassível e coerente com os números, reforcei apenas o valor real daquele acordo. E então, algumas semanas depois, ela se rendeu à racionalidade: aceitou nossa proposta, sem qualquer ressentimento de ambas as partes.
A vitória não foi apenas ter o contrato assinado, mas sim demonstrar que, mesmo diante de alguém que tem como maior habilidade emocionar pessoas, é necessário manter a racionalidade para viabilizar um acordo sólido, capaz de atender de forma genuína as necessidades e os desejos de ambas as partes.
A técnica de persuasão
A técnica de persuasão é uma estratégia de negociação que busca influenciar o pensamento da outra parte por meio das emoções, muitas vezes desviando o foco da análise racional.
Vantagens dessa técnica:
Estimula concessões, já que se baseia na empatia.
Preserva o relacionamento, pois cria um ambiente de proximidade.
O carisma e a sedução emocional funcionam como alavancas para viabilizar acordos.
Desvantagens:
Pode ser percebida como manipulação, comprometendo a credibilidade.
Pessoas mais racionais podem rejeitar propostas baseadas apenas em emoção.
Exige alta sensibilidade do outro negociador para ser capaz de perceber quando a conversa está se afastando da objetividade.
Como perceber se você está sendo vítima da técnica de persuasão?
Observe o clima emocional: se a conversa estiver intensa, com carga emocional elevada, faça uma pausa.
Questione sua própria motivação: estou decidindo por empatia, desejo de agradar ou medo de perder?
Reflita sobre os interesses envolvidos: essa proposta atende também aos meus objetivos, ou apenas aos da outra parte?
Conclusão
Se houver excesso de emoção em uma negociação, traga a conversa de volta para a lógica e a objetividade. A técnica de persuasão pode ser legítima quando usada para gerar conexão emocional, com equilíbrio, mas precisa ser percebida para que você não seja conduzido por ela sem perceber, mas quando a conversa estiver carregada de histórias envolventes ou apelos emocionais, respire fundo e volte ao básico:
Quais são os fatos concretos?
Quais são os meus objetivos reais?
O que estou disposto a ceder — e o que é inegociável?
Não se trata de ser frio — mas de ser lúcido.
Negociar bem é isso: saber ouvir, conectar, mas também manter firmeza de análise e clareza de propósito.
"O homem sábio é aquele que domina as suas paixões com a razão” . Pensamento estoico.
Helinho, você é um craque. estimo ter feito em torno de 17.000 negociações contratuais. sim, dezessete mil. eu era diretor de produção dos três horários de novela, mais o Caso Verdade. havia os contratos longos das grandes estrelas, obras-certas por novela e cachês para participações.
eu fazia as negociações mais importantes e parametrizava os valores para um gerente que trabalhava comigo oferecer. aprendi que, em vez de colocar emoção nas negociações eu precisava fazer o ator entender que os limites traçados por uma pirâmide cuidadosamente discutida com diretores envolvidos com remuneração não representava desvalorização do trabalho daquele ator, mas a preservação do equilíbrio e equidade entre os já contratados e os novos. "mas fulano ganha muito mais...!" pode ser, mas ele está trabalhando aqui há muitos anos e construindo um peso específico considerável para o reconhecimento e motivação. e por aí foi uma vida fazendo isso, até que, já não suportando mais fazer aquilo, uma mudança na administração da empresa designou outra pessoa para se ocupar com as negociações contratuais. a negociação salarial tabelada por uma empresa ou sindicato é radicalmente diferente da com artistas. ali se lida com pessoas sensíveis, mais instáveis emocionalmente e com um componente especial: a vaidade.
Já participei de negociações com apelo emocional, não foi com uma pessoa mas um grupo de pessoas dos dois lados ! Com essas considerações feitas em seu texto, excelente por sinal , poderia ter tido um resultado melhor