Consenso aparente, fracasso real. Aprendizados na batalha Haddad e o aumento do IOF
Quando intenções se perdem sem coalizões bem construídas.
Contexto da negociação
Recentemente, na Residência Oficial da Câmara em Brasília, reuniu-se o ministro da Economia, Fernando Haddad, o presidente da Câmara, Hugo Motta, e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, para acertar a estratégia de aprovação do aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) — medida que visava arrecadar cerca de R$ 10 bilhões ainda em 2025. Ao deixar o encontro, Haddad declarou estar “100 % convencido” de que o consenso entre os presidentes e líderes partidários estava consolidado. Contudo, o projeto foi rejeitado em votação no Congresso. Surpreso, o ministro disse sentir-se “incapaz de entender” o que ocorreu após a reunião.
Não é conhecido como foi conduzida esta reunião, e, tão pouco o que ficou decidido. No entanto, há um fato, a reunião não foi bem sucedida em função da declaração Haddad.
O que pode ter provocado o colapso de um acordo aparentemente fechado?
Possíveis causas do fracasso
Falsa sensação de acordo
Convergência de intenções sem compromisso explícito. Em negociações complexas e demoradas é muito importante para cada progresso, validar o que está acordado e o que não está sendo superado, pois em situações que exigem conversas difíceis é fundamental ter clareza e transparência para evoluir.
Leitura equivocada das entrelinhas
Em ambiente de baixa confiança, ignorar sinais não-verbais pode levar a interpretações erradas. Em tais situações, é fundamental identificar aonde está o poder decisório e focar neste ponto focal as decisões e sobretudo, perceber o que está sendo dito através dos comportamentos, pois muitas vezes o que está sendo comunicado não está sendo feito através das palavras. Nesse caso, pode ter ocorrido da parte do governo, uma leitura errada do contexto da reunião acreditando que se caminhava para um consenso , e , não se percebeu o contrario.
Desconhecimento dos reais interesses dos participantes
Cada participante exige estilo de comunicação distinto. É imprescindível identificar a verdadeira agenda de interesses de cada participante.
Ausência de comunicação conjunta sobre o resultado
Ausência de comunicação conjunta sobre os progressos obtidos na reunião. Em situações que envolvem negociações tão complexas, é fundamental ao final da reunião combinar o que será formalizado sobre os progressos e o que precisa de evoluir para chegar a um consenso. Muito provavelmente, não foi acordado o que seria divulgado após a reunião, e aí, cada líder repercutiu segundo sua própria leitura do encontro.
Recomendações para mitigar risco de fracasso:
Formalizar entendimentos chave
Combine, antes de encerrar a reunião, os pontos aprovados que serão comunicados e identifique os pendentes. Certifique-se que os pontos acordados são críticos ou imprescindíveis para o acordo.
Divulgar o acordo de maneira coletiva
Emita comunicado conjunto para reforçar o comprometimento coletivo e evitar “zonas cinzentas” sobre o entendimento do que está sendo aprovado.
Mapear decisores e influenciadores
Identifique quem detém o poder decisório e quem pode influenciar a opinião interna, pois nesses casos, dependendo do perfil pode ser que hajam agendas ocultas que não ficam explicitas nas conversas.
Planejar cenários alternativos
Prepare “Planos B” e defina estratégias de resposta a objeções ou mudanças de postura.
Conclusão
Em toda negociação de alta complexidade, o diabo mora nos detalhes: é na leitura apurada do contexto, na articulação prévia com quem detém o poder decisório e na confirmação de cada ponto aprovado que se constrói um acordo sólido. Além disso, é fundamental manter-se resiliente diante das pressões, contornando obstáculos e ajustando a estratégia sem perder o foco. Sem esses elementos e sem a perseverança necessária para insistir na busca de soluções viáveis, mesmo o “consenso aparente”, se desfaz rapidamente. No fim das contas, o maior desafio de um grande negociador é ouvir nos “silêncios” o que ficou por dizer, articular o poder que está além da retórica e garantir que cada palavra dita se converta em um passo concreto rumo a um acordo sustentável que atenda de fato às necessidades de ambas as partes.
“Os detalhes fazem a perfeição, e a perfeição não é um detalhe.” Leonardo da Vinci