A negociação mais difícil da minha vida: uma verdadeira transformação intrapessoal

Os bastidores de uma transição estratégica conduzida com diálogo e coragem

Há alguns anos, fui convidado a integrar um ambicioso projeto de cost efficiency, cujo objetivo era adequar as remunerações à nova estrutura de custos da empresa. O desafio que me coube: reestruturar uma área liderada por um executivo exemplar — um gestor com NPS acima de 80, amado pela equipe e reverenciado pelos clientes.

À primeira vista, tudo parecia paradoxal. Por trás daqueles resultados impecáveis, nos relatórios e nos sorrisos, havia uma sentença silenciosa: seu salário excedia o limite, sua idade avançava e, em breve, sua área seria fundida a outra, eliminando sua posição. A diretoria me alertou:

“Conduza tudo com o máximo de respeito — sem traumas, sem ruídos.”

Manter a operação em pleno funcionamento e, ao mesmo tempo, preparar a saída de quem fazia aquela engrenagem girar parecia uma tarefa digna de equilibrista.

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O poder da escuta ativa

Minha primeira decisão foi abandonar o powerpoint. Marquei uma conversa franca, apenas eu, ele e sua história na empresa. Busquei entender:

• O que o motivava todos os dias?

• Quais eram as expectativas e necessidades?

Ele relembrou desafios superados, metas batidas e o propósito social da organização. Ao mesmo tempo, admitiu perceber as mudanças do mercado — novas dinâmicas, margens reduzidas, necessidade de cortar custos e renovar parte da estrutura.

A cada resposta, reforçava-se em mim a convicção de que qualquer solução só faria sentido se construída em parceria.

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A virada decisiva

Nas conversas seguintes, ele se permitiu abandonar a armadura de gestor infalível:

“Sinto-me acomodado, pouco desafiado. Percebo que meu ciclo aqui está chegando ao fim.”

Essa confissão ressoou como um terremoto. Ver a lucidez com que ele avaliava seu momento revelou que, para avançarmos, seria preciso agir com coragem.

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Desenhando o plano juntos

Com base naquele entendimento mútuo, pactuamos um roteiro de transição de doze meses:

1. Transparência total — comunicar o processo à equipe com antecedência, preservando a confiança;

2. Suporte emocional — encontros regulares para reforçar autoestima e vislumbrar novas possibilidades;

3. Cronograma alinhado — tempo hábil para transferência de responsabilidades sem atropelos.

Ao longo de um ano, celebramos cada marco: a passagem de tarefas, as descobertas de novos caminhos e, sobretudo, o alívio de quem reconhecia a própria capacidade de se reinventar.

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O espelho final

Agora que o processo foi concluído, posso revelar o que não disse até aqui: o executivo dessa história sou eu.

Desde o início, eu sabia que estava conduzindo a negociação mais delicada da minha trajetória — e que ela era comigo mesmo. Durante meses, criei uma estrutura de diálogo e cuidado como se fosse para um terceiro, mas, na verdade, era uma forma de me preparar emocionalmente para uma decisão que já se desenhava internamente.

Depois de 25 anos dedicados à empresa, reconheci que meu ciclo havia se encerrado. A conversa mais difícil foi a interna: aceitar que meu papel já não era mais o mesmo e que minha permanência poderia me afastar do que me move de verdade — o desafio, a reinvenção, o propósito.

Enfrentar minha própria saída exigiu:

• Clareza para enxergar a realidade além do ego;

• Coragem para planejar minha saída com a mesma dignidade que sempre defendi para os outros;

• Generosidade para deixar espaço para o novo, tanto na organização quanto em mim.

Escrevo este texto não como uma despedida melancólica, mas como um relato honesto de alguém que decidiu, com convicção, ser protagonista da sua mudança e virar a página. Aprendi que as mudanças mais profundas não exigem apenas estratégia — exigem verdade. E que a liderança mais transformadora começa dentro da gente.

"Nada é permanente, exceto a mudança” — Heráclito de Éfeso.